Dez poemas de Nicolas Behr







ALFREDO  CESCHIATTI

 

prometeram

legiões de anjos

 

olhei para cima

 

vi apenas três

 

 

 

 

 

 

ALOYSIO CAMPOS DA PAZ

 

ao entrar no sarah

o vi de longe,

numa cadeira de rodas

 

dava voltas

sobre si mesmo

rodopiava e ria, ria

 

se aproximou, pegou

firme no meu braço, e disse

me olhando nos olhos

 

eu não queria morrer

 

 




BRUNO GIORGI

 

o vento

erodiu-me

por dentro

 

sopro sobre o pó

sangro sobre o sangue

 

o que era ferro

agora é ferrugem







 

 




CASSIA ELLER

 

diamante bruto

 

quanto menos lapidar

mais brilha

 

 

 

 

 

 

CLARICE LISPECTOR

 

peguei

na tua mão

e ela estava fria

 

não era sonho

não era azul

 

cegos e nus

atravessamos o espanto

 

 




EZECHIAS HERINGER

 

tudo quer se fixar,

enraizar, penetrar

 

tudo quer se decompor

virar pedra

 

a árvore que te hospeda

o poema que te escreve







 

 

 

 


JOSÉ SEVERINO DA SILVA

 

e eu?

 

que estou cimentado

na fundação de algum edifício

de brasília que nem sei o nome

(agora também não adianta saber)

 

e eu?

 

que pegava na vida

sem luva?

 

 

 



MARIA DO BARRO

 

um passarinho me contou

que foi casada

com joão de barro

 

os filhotes nasciam

com as asas trincadas

mas voavam alto

 

o ninho

num galho

de nuvem

 





PAULO TOVAR

 

teu acerto incerto

meu erro perfeito

 

nossos fracassos

bem sucedidos

 

teu voo de juriti errante

o dia querendo vir

 

teu câncer na cabeça

minha doença crônica

 

o que nos salva

é sermos incompletos







ROBERTO BURLE MARX

 

esta planta / palavra

 

combina com aquela

árvore / poema

 

esta cor / letra

gosta daquela

folha

 

em branco

 

 

 










(fotografia: Bento Viana)


Nicolas Behr (Nikolaus von Behr)  nasceu em Cuiabá, em 1958. Está desde 1974 em Brasília. Seu primeiro livrinho,  mimeografado,  é de 1977, o Iogurte com Farinha, seu “best seller”, pois vendeu cerca de 8.000 exemplares de mão-em-mão. Foi redator publicitário. Participou do movimento Ecológico, tendo fundado várias ONGs ambientalistas no DF nos anos 80. Seu livro Laranja Seleta – poesia escolhida – 1977-2007, lançado pela Língua Geral,  foi finalista do Prêmio Portugal Telecom de Literatura, em 2008.Em 2015 o Instituto de Letras da Universidade de Brasília instituiu o “Prêmio Nicolas Behr de Literatura”.  Sua obra tem sido objeto de dissertações de mestrado e documentários. Casado, três filhos, dedica-se profissionalmente  a  um viveiro de plantas.  Adora  Brasília. Estes poemas são de seu último livro, Rasília (edição do autor, 2020), que pode ser adquirido com ele em  paubrasilia@paubrasilia.com.br, pelo Facebook ou pelo Instagram.




Imagens: Ligia de Medeiros

 

 

 


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