Cinco poemas de Tito Leite
ESCASSO
Se o tempo
não deteriorasse
eu o chamaria
eternidade.
Uma colheita,
uma foice.
O pássaro nasce e já é voo.
POEMA
Não
quero
navegar
nos mistérios
dos
mares jônios
como
quem aprende
a
língua do logos.
Um
bom poema
não
deseja
aplainar
as dobras
de
uma estrela
que
perdeu o cimo,
mas
interpreta
um
pássaro
que
ultrapassa
os
seus passos
e
nasce do fogo.
Quero
nas palavras
as
imagens abertas
ao
sereno da pele,
qual
uma cítara
mágica
no vinho suave
da
madrugada,
como
quem se completa
nos
quatro
elementos.
Prefiro
o
pulo errante
de
um gato que incomoda
no
telhado
a um
solo de guitarra
que não
rasga
o
céu dos injustos.
PORTARIA
Não
adianta lutar contra
o que não
somos páreos.
Deixar a vida
à míngua esperando
o edital do ministério
dos tolos.
Sabedoria é domar
os ventos
contrários.
MONTURO
O carvão pensa
a
combustão
das vielas sujas
do
homem fóssil,
metrifica
a
morte
como
quem
medita
sobre o passante
que
não
conhece
a
palavra ócio.
Assim
declara
o patrão:
o
que mata
é a
falta do capital.
Não,
o
que mata
é o
ismo
do
seu fast-food.
Cansado
do
agronegócio
de
um sistema que nos
marca
como gado,
faço
frente
às
palavras
de
ordem
e
não me curvo.
SUBLIME
Acredito
que nos poemas
de amor
um rei bailarino
foge do senso e reza
com o corpo.
A existência
e o âmago
são sacramentos.
Declamo-te
com címbalos
e língua de fogo.
Tito
Leite (Cícero Leilton) nasceu em Aurora/CE (1980). É autor do livro de poemas Digitais do Caos (Selo edith, 2016). É
poeta e monge, mestre em Filosofia pela Universidade Federal do Rio Grande do
Norte. Tem experiência na área de ensino de Filosofia, com ênfase em Filosofia
política, Ética, Filosofia da Ciência e da Tecnologia. É curador da revista
gueto. Tem poemas publicados em revistas impressas e digitais. Aurora de Cedro é o seu segundo
livro.
Imagens: Theo van Doesburg
A poesia de Tito é um atestado de maturidade literária. Com amplo domínio do código linguístico, ele concebe poemas de precisão formal, com metáforas inusitadas e imagens renovadas. Grande poeta, o Brasil precisa descobri-lo.
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