Quatro poemas de Zainne Lima da Silva
escrever é minha faca só
lâmina
me corta profundo
não sangro
não sei se dói
o corte
a imagem perfurada seca
ou o espelho que a faca é
me mostra o poema
maturado andando sozinho
encima de mim.
me corta profundo
não sangro
não sei se dói
o corte
a imagem perfurada seca
ou o espelho que a faca é
me mostra o poema
maturado andando sozinho
encima de mim.
A educação pela pedra ou A educação pela noite
de madrugada eu trabalho
eu e os pedreiros construindo
em frente à minha casa
eu e os pedreiros construindo
em frente à minha casa
erguemos obras de tijolo
e cimento
a cada rabisco da caneta
ajunta-se um reboco de parede
a cada rabisco da caneta
ajunta-se um reboco de parede
eu também sou arquiteta
popular
com algumas pedras noturnas ergo
a minha poesia.
com algumas pedras noturnas ergo
a minha poesia.
A duplicada
eu
visto permanentemente
uma máscara
de pele mais escura e resistente
com a identidade de zainne lima da silva
tenho duas faces de moeda sem valor
tenho duas de mim
uma tenta a vida no tempo agora
a outra inventa o momento seguinte
e o anterior
não me acomodo no tempo
estou entre desver e transver a poesia
transcrever fauna e flora para a língua universal
e ser uma mini deusa negra
como minha avó e minha neta
que não existem
mas que estão prontas na supermassa da oleira
que sou toda vez que escrevo
ou quando digo não
para um verbo de estado.
de pele mais escura e resistente
com a identidade de zainne lima da silva
tenho duas faces de moeda sem valor
tenho duas de mim
uma tenta a vida no tempo agora
a outra inventa o momento seguinte
e o anterior
não me acomodo no tempo
estou entre desver e transver a poesia
transcrever fauna e flora para a língua universal
e ser uma mini deusa negra
como minha avó e minha neta
que não existem
mas que estão prontas na supermassa da oleira
que sou toda vez que escrevo
ou quando digo não
para um verbo de estado.
[sem título
escrever o poema
como se aria uma panela velha
até que de seu ferro
se extraia um espelho
em que se veja no branco do olho
a lágrima dele escorrida
no dia anterior.
como se aria uma panela velha
até que de seu ferro
se extraia um espelho
em que se veja no branco do olho
a lágrima dele escorrida
no dia anterior.
Zainne Lima da Silva (94) é filha de Nara (Bahia) e José (Pernambuco). Vive em Taboão da Serra, SP. Bacharela em Letras pela FFLCH-USP, é professora, prosadora e poeta. Militante da literatura negro-brasileira. Autora de Pequenas ficções de memória e Canções para desacordar os homens (no prelo), ambos pela Editora Patuá. Publica textos em diversas coletâneas e antologias em meio impresso, além de apresentar suas produções em revistas e plataformas literárias on-line.
Imagens: Norman Lewis
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