Cinco poemas de Charles Marlon















“Only a phase, these dark cafe days”

                           
Somos sozinhos,
quando o último cliente deixa
entrar o ar
da madrugada e o balconista, br-
uto, como devemos ser, quando adultos,
nos faz claro que nossa dor não é a 
única, nem nova, nem nossa e que é favor
largar de coisa e baixar uma gorda gorjeta.

Nos encolhemos, contra o frio, acostumamos,

sobre-
          vivemos,

nas ruas escuras, por acaso, o tempo não tarda,
o tempo é o tempo, coisa que inventamos,

nos versos de uma carta que não respondi,
te encontro
nova-
         mente:

há respostas que pedem mais vida,

não palavras.

Somos, sozinhos.













Setembro


Aquele ano não havia sido.

Um erro qualquer no calendário
impedia a marcha dos dias dentro
do dúbio mecanismo: sincera-
mente, chora quem esconde o que
não quer sentir. 

O comércio fechado, para o descanso 
televisivo, domingo é um dia triste, até 
que se prove o contrário. Setembro entrou
com ira da natureza, era preciso lavar a 
superfície do mofo parado nas calçadas.

Está ouvindo? Era um sinal.

A chuva ecoa no telhado, recomeça
a vida, com a força de uma promessa
que não precisa. E a pressa era o passo
que distanciava nosso caminho

até 

aqui.












Blue


Songs are like tatoos veste
melancolia em voz o sotaque 
de um idioma estrangeiro ao
próprio idioma - algumas palavras
são intraduzíveis. 

Temos na cabeça obras completas,
de preencher braços 
inteiros, interiores que ecoam sons
como em conchas, reverber-
ações de acordes consoantes.

Tomo tua mão e tremo,
o frio é costumeiro, sabemos
bem onde nos levam estas ruas,
mas o itinerário secreto desse caos
no peito, sequer sabemos

celebremos isto.













“All we need is just a little patience”


Ha canções que só o tempo faz de-
cantar dentro de nós, pois aprendemos
o valor do ritmo e de sua aceleração

-nunca da pausa-

com o tempo aprendemos a esconder
essas suas músicas tristes

dividir uma lágrima
sentir, seja uma falta,

de cor:
só teus olhos e teu silêncio que me ensina
tudo aquilo que palavra nenhuma soube explicar.
















Little Green


Nem teu jeans, cuja recorrência
é ser a pura matéria azul por 
falta de cinza, é banal, adorno
de formas coloridas, a geometria 
que te constitui nem sei traçar, o
fascínio de ser o puro mistério de
uma timidez serena que me faz corar
sem decorar nunca o caminho que leva
a ti. 

Como que do teu lado, o tempo não existisse, 
há um labirinto em cada frase que fases, quero e não quero ver-te


e me perco no labirinto de olhos que dissecam
toda e qualquer superfície,
sem contar o segredo que viu,
acumulado no peito.












Charles Marlon é pai da Louise e escreve, agora porque precisa. Tem quatro livros pela editora Patuá, Poesia Ltda (2012), Sub-Verso (2014), Re-trato (2016) e Quarto (2018). Tem dois livros a serem lançados no próximo ano um de poesia, Cirrus pela editora Patuá e um de contos, Pirita pela editora Fractal. Contato: charlemarlon@gmail.com.

















Imagens: Hans Arp

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