Quatro poemas de Carlos Orfeu









guarda-chuva

morcego de asas
dobradas
 
guarda nuvens
despedaçadas

goteja
com desespero
réstia de relâmpago
fiapos de águas

o guarda-chuva
repousa
na semi-
luz
da sala









baldes

os baldes esses soldados
com o deserto na boca

a água é tão volátil
quanto o desejo de tê-la

absoluta
no fundo do cloro

na brisa diurna da varanda
eles espreitam
o equilíbrio da libélula










caramujo

caramujo amadurece
no fóssil da folha

jarros abrigam em si
outros mundos líquidos

olhar a si mesmo  através
da película das coisas

há infinitas moradas
nos mínimos gestos










paredes


paredes também possuem  feridas

descascados mundos enrodilhados em teias
sêmens de aranhas sobre afetos envelhecidos

caligrafia de vozes no limo do tempo
cicatrizes re-abertas como nódoas de existir

paredes também possuem  feridas

quando o sol toca suas peles enrugadas e opacas
há um brilho semelhante ao olho que espreita






Carlos Orfeu é carioca, nasceu e habita em Queimados.
Em 2016, lançou Invisíveis cotidianos pela Editora
Literacidade, e Nervura, em 2019, pela Editora Patuá.
















Imagens: Google


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