Cinco poemas de André Giusti
Depois de tanta euforia
Nos
últimos tempos
ficamos
mais sérios,
inconveniente
que é
contar
piadas a toda hora.
Agora
somos mais breves,
aconselhados
que fomos
a
falar apenas
do
que é pertinente.
Nos
tornamos mais práticos,
estamos
nos acostumando
a
agir apenas
em
benefício próprio.
De
uma hora para a outra
o
vento trouxe folhagens
amarelas
ao nosso rosto
na
meia-estação.
Do
mesmo modo,
um
ciclo acabou
sobre
nossos pés
carpintados
pela terra.
A
primavera este ano
virá
feito um toque
de
recolher em Gdansk,
despertando
ímpetos
de
justiça com
as
próprias mãos.
1988
Poema
sem Título 4.
Em
silêncio,
misturado
às sombras,
vago
pela rua
procurando
a lua
para
iluminar pensamentos imundos.
Mas
não acho
nem
lua
nem
vida
nem
nada.
Não
há notícias de sobreviventes
nos
últimos meses.
Quando
durmo, sonho erótico
e
as mulheres que me amaram
assassinaram
as que eu não tive.
Acordo
ao lado do meu corpo
duas
horas antes do despertador.
1995
Poema
aparentemente sujo para almas lavadas
Eu
não acredito na poesia
inseminada
in vitro
na
poesia
asséptica
curvada lisa fria
feito
madona talhada no marfim.
Não
acredito no poeta
que
se esfalfa se torce pena sua
não
para cuspir na cara do mundo mau da hipocrisia,
mas
para que sejam suas as graças da patota
da
academia
as
páginas da antologia
a
menção nas teses sonolentas que ninguém que ame lua cheia ou faça
sexo sem nojo lerá.
Eu
só acredito na poesia que é vômito na madrugada em cima dos postes
ancoradouros de bêbados
Que
é escarro contaminado na emergência lotada da periferia
Que
é sémen apressado despejado no banheiro público da rodoviária.
Eu
só acredito em poemas escritos com sangue nas folhas brancas
encardidas encontradas jogadas no chão engordurado do boteco que
vende marmitex a R$ 5,00 ao lado do puteiro.
2013
Talking‘bout our generation
2013
Os
dias em que você começou a ir embora
Você
não é essa que saiu porta afora
anteontem
levando
em sacolas roupas sapatos escovas
o
passado feliz
o
presente morto
e
o futuro sem rosto.
Você
é aquela cujo sorriso
era
lua cheia dobrando noite de tempestade,
era
sol transformando quartos escuros em câmaras de luz.
E
essa foi se mudando daqui
em
pedaços
e
um pouco a cada dia
ao
longo dos últimos anos.
Eu
percebia e te avisava
que
você estava indo,
mas
você não ouvia,
não
se dava conta de que a toda hora
você
partia
e
deixava a porta aberta
para
que sempre um pouco de você
fosse
embora todos os dias.
Anteontem,
amor, você já havia
saído
de casa há muito tempo.
2012
2012
[Poemas
do livro
Os Filmes em que Morremos de Amor – Poesia & Prosa
Poética, Editora Patuá, 2016]
Talking‘bout our generation
Eu
é que não vou ficar aqui pagando
de
nostálgico
saudosista
passadista
dizendo
que antes havia
mais
romantismo
idealismo
poesia
inspiração.
Aqueles
nossos dias
são
divinos lindos
porque
não os vivemos mais
(o
que passou sempre
é
melhor com
os
olhos de agora).
Eu
só toquei no assunto
porque
hoje olhei no retrovisor
e
vi nossa geração
saindo
do bob’s
com
o disco novo do U2 na mão,
e
entrando no corredor
gelado
e vazio das decepções.
Se
eu tivesse talento para canções,
faria
uma só para dizer
que
os fantasmas dormem
sem
nada o que fazer agora.
[Poema
do livro De Tanto Bater com o Osso, a Dor Vira Anestesia,
a ser lançado em breve, pela Patuá.]
André
Giusti nasceu em maio de 1968 no Rio de Janeiro e mora em
Brasília desde a década de 90. Entre contos, crônicas e poemas
escreveu A Solidão do Livro Emprestado (contos), cuja segunda
edição foi lançada recentemente pela Editora Penalux. Seu livro de
estreia, Voando pela Noite (até de manhã), publicado em 1996
pela 7Letras, foi finalista do Jabuti no ano seguinte. Recentemente
publicou A Maturidade Angustiada, também pela Penalux, e Os
Filmes em que Morremos de Amor, seu primeiro livro de poemas, que
saiu pela Patuá, em 2016. Atualmente trabalha em seu primeiro
romance. Também é jornalista. Mantém site e blog em
www.andregiusti.com.br.
Imagens: DryHundredFear
Imagens: DryHundredFear
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