Três poemas de Matheus Guménin Barreto








corpo: que coisa será essa
a que servirá ou a quem, computará quem
os beijos que deu e dará e quem os tons
de carmim que já viu aos domingos e quem                                    
os cachorros que lhe lamberam os dedos e quando
e quem computará as madrugadas e o branco que fazem
e quem
os sons que gestou na garganta e não disse e quem
o amor miúdo e bom que reina entre as paredes de um apartamento e quem
dirá a esse corpo que tudo
cedo ou tarde
não vai ter existido
na garganta faminta do tempo?







é lícito um poema onde ecoem passos                                 
de um único homem ou de sua sombra os passos?               
é lícito o poema de uns pés descalços, limpos, sobre um
pátio ainda mais? lícito
que água ainda não convexa de toques nem
de rostos outros espelhados que um só rosto, que essa água
reste?
ecos, passos, sombras, pés descalços, toques?                      
é lícito que haja? é lícito que haja tão rara palavra:
lícito?
                                                                                        
é lícito que haja o que haver em versos
como estes
se  os  tiroteios  furam a  pele de uma mãe de um pai de um filho e de um que não 
nasceu e não nascerá num canto escuro qualquer deste país que nem me digno a 
saber  enquanto escrevo  um poema sobre escrever um poema sobre um revólver 
calibre 38 que resolve anular o tempo?






O AMADO, MORNO, À MEIA-LUZ

O amado, morno, à meia-luz
febril, que toca o amado ereto;
aflito, esquiva-se da luz
o amado, morno, à meia-luz,
febris os dois, febris e nus.
Aflitos – se são descobertos
o amado, morno, à meia-luz
febril e o seu amado ereto!








Matheus Guménin Barreto (1992- ) é poeta e tradutor mato-grossense. É autor dos livros de poemas A máquina de carregar nadas (7Letras, 2017) e Poemas em torno do chão & Primeiros poemas (Carlini & Caniato, 2018). Doutorando da Universidade de São Paulo (USP) na área de Língua e Literatura Alemãs - subárea tradução -, estudou também na Universidade de Heidelberg (Alemanha). Encontram-se textos seus no Brasil, na Espanha e em Portugal (Revista Cult, Escamandro, plaquete “Vozes, Versos”, Revista Escriva [PUC-RS], Opiniães [USP], Diário de Cuiabá; entre outros), e integrou o Printemps Littéraire Brésilien 2018 na França e na Bélgica a convite da Universidade Sorbonne. 



Imagens: Kazimir Malevich




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