Três poemas de Isabela Sancho







Colmeia

Coliseu despovoado,
com o peso do verão alto
seu ar zumbe
os expurgos de um país inteiro.

Jazem os urros

da plateia em onda,
grande corpo, grande besta
que bate a terra clamando
sua imbecilidade por direito.

Molduras para a solidão
múltipla, os arcos
anunciam o escuro

velho leão a digladiar.






Adverte-nos

Destina o cuidado que não tem
a placa desenhada a cão de caça.
Se a realidade lhe faz jus
o portão aberto

nos fita o apuro.

Retumba a sós

o golpe muscular
do dobermann
que a essa hora talvez durma
ou nem sequer exista






Inglória

Ao madrigal do relento
leva-se embora um colchão de calçada
e transformam-se as oferendas
em marmitas que os cachorros pisam

as pombas ciscam de manhã
no milharal, vômito da madrugada

na qual morre ou nasce uma pessoa de verdade
não um vento no trigo
não uma miragem
revirada e dormida de glote
focinhada de boca
sem dentes sem roupa
no paraíso quebrado 

deste país





Isabela Sancho nasceu no interior de São Paulo, em 1989. Estudou desenho e se formou em arquitetura pela Unicamp. É autora e ilustradora da plaquete Quem fala em seu nome (Editora Primata, 2019) e dos livros de poemas As flores se recusam (Editora Patuá, 2019 - menção honrosa no Prêmio Literário Glória de Sant'Anna, Portugal) e A depressão tem sete andares e um elevador (Editora Penalux, 2019).









Imagens: Google










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